terça-feira, 24 de julho de 2012

A farra dos prescritos

 A ministra do TCU, Ana Arraes, considerou que a agência de Marcos Valério não deveria ter devolvido o dinheiro do desconto que sua agência ofereceu para fazer uma campanha do Banco do Brasil. A sentença saiu sexta-feira. Assim, se a campanha custou 10, mas a agência fez um desconto de 2 a campanha custou na verdade 8. Mas se do caixa saíram 10, por força de contrato a agência deveria ter devolvido 2. Não devolveu, e isso não foi considerado ilegal. Então na contabilidade do Banco consta que saiu 8. No caixa de Marcos Valério entrou 10. Para onde foram os outros 2? Bingo, para o Mensalão. Se isso não é crime, por extensão o Mensalão "corre o risco" de não ser considerado corrupção, pois a principal forma de, digamos, apropriação de recursos públicos que seriam futuramente distribuídos foi considerada legal.
Ana Arraes é mãe do governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Foi indicada em setembro do ano passado para o Tribunal de Contas. Na primeira entrevista como ministra já avisou "Vou ao TCU servir ao meu país (...)zelando pelos recursos públicos, mas também com o olhar da política." Na época ficou difícil entender esse "mas também com o olhar da política", ainda que se desconfiasse. Bem, dona Ana, já entendemos. Seu pai, Miguel Arraes, nome forte de combate à ditadura, deve estar com vergonha de ti.
Aliás, seu filho foi um dos envolvidos no chamado "Escândalo dos Precatórios". Faz tempo, foi em 1996. Ele escapou do STF, porém não pode exercer cargo de direção em empresa fiscalizada pelo Banco Central até dezembro deste ano. Mas pode ser governador.

O professor de matemática Delúbio Soares, que atualmente se diz corretor de imóveis, ainda detém o troféu de cínico do século ao dizer que o Mensalão não existiu porque os pagamentos não eram mensais. Agora prepara sua peça de defesa para assumir sozinho toda a história. A mesma estratégia da defesa do goleiro Bruno, que tentou jogar a culpa toda em Macarrão. Os promotores mineiros já se preparam para surrar impiedosamente a tese do atleta. Os juízes do STF, alguns deles, parecem se preparar para aceitar impiedosamente a tese do professor.

O ministro Ricardo Lewandowski na verdade não demorou a preparar sua revisão ao processo do Mensalão. Ele apenas esperou que os crimes prescrevessem. O cuidado tomado pelo STF foi exemplar em praticamente todos os momentos. Todo o processo está digitalizado há quatro anos. Houve uma seção em 2007 só para decidir que os réus fossem avisados por carta da abertura da ação penal. E Lewandowski demorou o tanto que demorou.
Os ministros começarão a votar em 30 de agosto. A partir desta data, ora vejam, um dos crimes que tipificam o Mensalão, o de formação de quadrilha, já será prescrito, caso os réus sejam condenados a penas mínimas. Em 03 de setembro o ministro Cezar Peluzo fará 70 anos e terá que abandonar o julgamento pois se aposentará compulsoriamente. Se contarmos Dias Toffoli, o STF terá assim 10 membros. O empate nas decisões favorece os réus.

O ministro José Antonio Dias Toffoli foi advogado do PT por muitos anos. Num destes períodos foi chefiado por José Dirceu, réu do processo. Sua namorada, Roberta Rangel, foi advogada de outro dos réus, Professor Luizinho. Toffoli levou bomba em dois concursos para juiz, nunca escreveu uma linha sobre a magistratura, mas com 42 anos foi nomeado Ministro da mais alta corte do país. Sua missão é não se sentir incomodado com os dados descritos acima e dar seu voto absolvedor. Nada se falou até agora sobre ele se considerar impedido de julgar. Só quem pode fazer isso é ele mesmo - no máximo pode haver uma contestação do Procurador Geral, mas até isso já foi descartado.

Todos os aqui citados estão dando duro para transformar o que poderia ser uma festa da democracia numa decepção. No fim do julgamento, que será eclipsado pelas eleições municipais, poucos serão os condenados, muitos serão os prescritos. Vai ficar a sensação de tentativa de golpe, de manobra da mídia golpista.

E na eleição presidencial de 2014, o fato "novo" será a presença de Eduardo Campos. Aquele dos precatórios, filho de Ana Arraes...