quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Pasárgada

"Vou-me embora de Pasárgada / Sou inimigo do rei (...) / A existência é tão dura / As elites tão senis / Que Joana, a louca da Espanha / Ainda é mais coerente / Que os donos do país."
Millôr Fernandes

O sujeito se chamava Milton Viola (o que já daria um samba) Fernandes. Virou Millôr por conta de um modo estranho com que seu nome fora escrito pelo escrivão do cartório. Disse frases lapidares, e a que mais se adaptaria aos dias de hoje foi disparada quando se começou a distribuir indenizações para os perseguidos e os nem-tão-perseguidos-assim pela ditadura militar. Colocados no mesmo balaio, alguns disputando o butim com até mais vigor do que com que lutaram contra a ditadura, motivaram Millôr a tascar sobre os esquerdistas: "Aquilo não era ideologia, era investimento."

Pode ser esta uma outra explicação para tanto roubo perpetrado por aqueles que bradavam contra o roubo, além da mais óbvia, que o poder corrompe. Mas é pouco. Essas pessoas pareciam ter um projeto de país. Pareciam buscar justiça, igualdade e ética na política, defendendo estas bandeiras com uma disposição de morte. Provaram-se embustes, tanto no campo ético como no administrativo. 

A decepção virou raiva, e num indício que as coisas vão bem mal, a ira coletiva se organiza espontaneamente na forma dos panelaços, os cara-pintadas da Dilma. Mais que isso, tem as passeatas. Domingo agora, dia 16 de agosto, aniversário de Millôr Fernandes, tem outra. 
Parece que o "fora Dilma" vai pegar. Parece que o impeachment ou a renúncia são questão de tempo. Mas a real conclamação da data teria que ser "vamo-nos embora de Pasárgada". Não só no sentido da paródia acima que compara Pasárgada ao Brasil. Não.Vamo-nos embora da terra idealizada, do gigante adormecido, do país do futuro. Chega! 

Vamos em direção a um país forte nas suas instituições, a fim de intimidar os ladrões de todos os níveis. Vamos em direção a eleger pessoas de carne e osso, não semideuses. Pessoas que errarão certamente, que roubarão certamente, mas que possam pagar pelos erros e assim vamos purificando a nação aos passinhos e às passeatas.
É hora de parar de se referir ao brasileiro na terceira pessoa. 

É hora de dar valor a cada indivíduo que mora aqui, com suas potencialidades de todos os tamanhos, não reduzi-lo sempre a parte de um coletivo. É hora de entender que "coletivos" deixam no nascedouro de ser grupos de pessoas que lutam por direitos para logo passarem a ser bandos armados que reivindicam privilégios a custa do cerceamento do direito dos outros.
É hora de assumir que temos, a maioria do povo, uma outra mentalidade. 

Esperar que de todo este movimento desta época surja outra Pasárgada é um retrocesso. País decente não se faz com amigos do rei. País decente é aquele em que o rei entende que serve aos súditos, e ai dele se não entender.  
O final deste processo será de vitória se deixarmos de lado a busca desenfreada pelo orgulho nacional. Será um grande progresso se cada um de nós tiver orgulho de si mesmo. Orgulho do que fez de bom para si e para este que em breve vai ser um grande país, porque será habitado por nós, grandes cidadãos.

Domingo, vou-me embora de Pasárgada.
Domingo, vou-me embora para o Brasil.