sábado, 16 de junho de 2012

A voz do Brasil

Eu trabalhava com resgates em julho de 2007. Mais precisamente no dia 17. Passava das dezenove horas quando recebemos um chamado para transferir um paciente psiquiátrico que se encontrava no Hospital do Jabaquara. Rumamos para o dito hospital com a sirene ligada.
Foi quando percebemos algo estranho: quanto mais próximos estávamos do hospital, mais os carros abriam caminho. Ostensivamente, alguns subindo nas calçadas, as motos parando os cruzamentos, os pedestres nos olhando com cara de aflitos. Dos bares as pessoas saíam para nos espiar, os marronzinhos da CET faziam gestos enfáticos para que passássemos mais rápido. Na entrada do hospital a segurança nos indicava com veemência o rumo da entrada de emergência, onde já nos esperava um séquito de profissionais. Na expressão de todos um grande assombro. Na cabine da ambulância não demos por nós naquela agitação. Por vezes gracejávamos por achar que nos confundiam. Quando paramos, mais surpresa: ligaram um holofote e todos acorreram, como se fôssemos estrelas. O colega médico perguntou com olhos arregalados: "Como está aquilo?". Não entendi lhufas: "Aquilo o quê?". Ele quase gritava: "O aeroporto!!!" Eu temi um linchamento mas perguntei fatidicamente: "Mas o que houve no aeroporto?". O holofote se apagou, o médico virou as costas e o séquito se dispersou em meio a um burburinho de decepção irritada.
Entrando no hospital pudemos ver na TV as imagens que nos tirariam o chão, do avião espatifado no prédio da TAM à cabeceira da pista de Congonhas. De volta à ambulância já com o paciente a ser transferido e saindo do hospital na condição de intrusos minutos depois da recepção de superstars, liguei o rádio por puro reflexo. Então tivemos a explicação de nossa alienação: assim como todos os cidadãos paulistanos e brasileiros que só dispunham da comunicação do rádio em seus veículos naquela hora, nós desligamos o som para não ter que ouvir a Voz do Brasil que seguia firme, ignorante do inferno que a cidade vivia.

Este programa longevo, já se vão mais de 70 anos desde que Getúlio Vargas colocou no ar o então "Programa Nacional", popularizou o ato de se desligar o rádio ou colocar um CD para tocar tão logo se fazem ouvir os acordes de "O Guarani". Mas ainda assim tem gente que o aprova. Saem em defesa dos matutos dos rincões que não têm acesso à notícias e que têm no programa o único meio para se informar. Devem pensar nos jecas, em suas choupanas rurais ouvindo um rádio chiento ligado a uma bateria de carro.
Pode ser desinformação minha, mas essa figura caipira não existe mais no Brasil. E cá pra nós, Getúlio não pensou em informar os jecas quando nos impôs o programa.
Há projetos propondo a flexibilização do horário da Voz do Brasil, de resto conseguida por liminares de algumas rádios. Acabar com esta excrescência ninguém propõe...

Em anos eleitorais, o rádio sofre outra violência, compartilhada com a TV, que é o Horário Eleitoral Gratuito. A parte mais interessante deste "Horário" se dá antes de sua veiculação, quando os partidos saem à praça em busca de minutos de programa e assim colocam almas, ideologias e convicções à venda. O PT acaba de entregar um cargo em um Ministério a um indicado de Paulo Maluf a fim de obter o apoio do PP e a ele se coligar. O objetivo foram os minutos a mais no "Horário" que tal união trará. Se não me engano, o cargo foi para o Ministério das Cidades, não tenho certeza mas isso tem pouca importância - não para mim, mas para o PT.
O PSDB também já envergonhara a militância ao fechar acordo com o PR (que se aboletou nas tetas do Ministério dos Transportes de Dilma) pelo mesmo motivo.

Nem a Voz do Brasil, nem o Horário Eleitoral Gratuito vão sumir. Eu sei.
Mas uma sugestão seria medir o Ibope do "Horário" na TV. Sério mesmo. Quem sabe assim, ao constatarem que uma parcela mínima da população assiste àquela infâmia, eles desistam de se vender por minutos. Quem sabe assim possam se vender apenas por trinta dinheiros. Ou talvez por menos...

Um comentário:

  1. "Excrescência " foi ótimo!rsss E o PT se vendeu por 90 segundos.Pode se vender até por mais,porque o PT nao emplaca em Sampa. Acho que bênçãos a Wrunda.Bj!

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